terça-feira, 22 de outubro de 2013

A erva daninha da alma


Então veja como soa patético: “seu cabelo é bom e o meu cabelo é ruim”. Seu cabelo é bom por causa de quê? No sábado ele fez alguma caridade? E meu cabelo é ruim por causa de quê? O que é que meu cabelo fez? Fez alguma coisa com o senhor ou com a senhora? Porque, se ele fez alguma coisa desagradável com alguém, eu vou me retratar! (Prenda-me se for capaz, do livro “Parem de falar mal da rotina”, de Elisa Lucinda)
    Negra do cabelo duro? Loira burra? Gorda preguiçosa? Magra que se acha? Gay “afetado”? Homem machão? Mulher delicada?
    Preconceito: o conceito que se tem antes de conhecer algo ou alguém. Mas se nós JÁ CONHECEMOS negros, loiros, gordos, magros, gays, homens, mulheres e outros, porque o “conceito” ainda ganha o prefixo “pré”?
    Eu tenho dificuldade em também entender os motivos racionais do preconceito e da discriminação (se é que esses motivos existem!) E depois de escrever essa frase, preciso admitir que mesmo não entendendo, já fui vítima e atuante nisso. Acho que é hipocrisia ao extremo as pessoas se dizerem “preconceito free”. Isso não existe!! O preconceito não é um botão de liga/desliga!
    Temos preconceito contra coisas, modos de vida, animais, atitudes, pessoas. Ele parece ser uma sementinha, uma erva daninha da alma, um câncer, que, ao passo que cresce, vai matando tudo ao redor. É aquele sentimento ruim que você tem que superar todos os dias pra não cometer injustiça com quem não te fez nada!
    O preconceito gera a discriminação, e o seu significado é comumente aplicado às minorias (se é que assim podemos chamá-las). Quando falamos nisso, logo pensamos em negros, homossexuais e pobres e isso é algo com o qual eu não concordo. Eu não sou negra, nem homossexual, nem pobre e já sofri discriminação exatamente por não ser tudo isso! Não estou defendendo nenhum direito meu a ser discriminada (seria absurdo, né?), mas as pessoas surgem com essa noção fechada e imutável do que é preconceito e você que não se atreva a tentar mudar!!
    Como disse, não sou pobre. A grande questão nisso é que eu também não sou rica!! Não mesmo. Quando criança, perguntei a minha mãe o que nós éramos: ricos ou pobres. Ela respondeu: “minha filha, nós somos a maldita classe média, como a maioria”. Simples! Nem tudo o que não é branco é preto e nem tudo o que não é ruim é automaticamente bom. Não somos dualidades, mas, sim, pluralidades. Voltando à pergunta que fiz para minha mãe, a razão para eu tê-la feito é que nos mudamos de São Paulo (uma cidade onde as pessoas não conhecem sua conta bancária) para uma cidade do interior do estado, de 40 mil habitantes em média, onde o tratamento social muda de acordo com as circunstâncias. Na escola, achavam que eu era rica. Por isso, dependendo do interesse alheio, puxavam meu saco.
    Entretanto, essa minha cara de “criada pela vó” já me rendeu muita dor de cabeça. Vira e mexe, as pessoas dizem: “ai, você não quer vir conosco, porque não gosta de se misturar com pobre!!” QUEM DISSE QUE VOCÊ É POBRE? E QUEM DISSE QUE EU SOU RICA??? Aqui a questão não é nem mais o preconceito, mas sim o fato de alguns serem muito mal agradecidos por viverem exatamente com o que têm, e eu realmente fico com raiva quando as pessoas se auto intitulam pobres, sendo parte, na verdade,  da        MALDITA CLASSE MÉDIA, COMO EU!!! Odeio essas situações em que escuto um absurdo desses. Já disseram que eu não deveria ser professora, porque sou bonita e deveria trabalhar de secretária, recepcionista. Ah, meu... Isso acaba com a minha chance de ser simpática.
    Então, quando as pessoas me vêm falar de preconceito contra pobres, negros e homossexuais, eu acho tudo isso muito estigmatizado, apesar de também ser verdadeiro. O preconceito parece esteriotipado.
    Os esteriótipos levam ao preconceito, que, por sua vez, ajuda a gerar a discriminação. Como disse anteriormente, a noção de preconceito é quase sempre associada às minorias, mas o que são as minorias, senão as maioras? Afinal, TODOS já fomos alvo de preconceito e TODOS fazemos parte de uma minoria, pela cor da pele, pela religião, pelo sexo, pelas escolhas pessoais e profissionais, etc.
    Por mais que eu não goste de esteriótipos, eles são parte importante da compreensão do mundo e não surgem aleatoriamente. Os esteriótipos têm uma razão de ser, mesmo que eu não goste deles. Utilizamo-nos para muitas funções, porque eles são representações abstratas e imaginárias do universo ao redor. A questão principal é saber romper com eles, uma vez que a pluraridade é observada. Então, ok, você já sabe que preconceito engloba todos aqueles pensamentos baseados em circunstâncias e atitudes injustas contra negros, homossexuais e pobres. AGORA MUDE ISSO! Agora que você já entendeu o conceito, expanda-o para outras variáveis, para outras minorias.
    O grande problema é o exagero da causa. Tudo é preconceito, tudo é discriminação. As pessoas anseiam em processar os outros por tudo hoje em dia!
    Há que se ter um senso de percepção aguçado para não falar barbaridades e ao mesmo tempo, não se podar o tempo todo, com medo. Chamar o cabelo de uma negra de ruim pode até não ser considerado preconceito POR VOCÊ, mas é falta de educação, além de ser um esteriótipo sem muito sentido, como o texto de abertura explicitou; mas cada um lida com suas características da forma que bem entende e gosta. No meu caso, o uso de uma camiseta com a inscrição “branca com orgulho” não deveria ser visto como incentivo à discriminação, uma vez que a mesma inscrição com a palavra “negra” não o seria.
    Não há modelos prontos do que deva ser sucesso e beleza; nós os construímos. Por esse motivo, ter certa peculiaridade não faz de você ou dos outros mais ou menos belos e mais ou menos bem sucedidos, somente humanos.
    Então, ao invés de dizermos: “tinha que ser negra/loira, gorda/magra, gay/hetero, homem/mulher”, deveríamos dizer: “tinha que ser humano, viu?!” Que recolhamos, assim, as ervas daninhas!


2 comentários:

Anônimo disse...

Essa palavra preconceito é meio estranha. Existe algo antes do conceito?
Mas o tal do preconceito existe, e muito.
Até eu, que pareço um loiro, alto, olhos azuis, bonito e senxual já sofri o denominado preconceito. Quem não o sofreu???
Isto bem demonstra que você tem razão: o ser humano é uma ...
Um professor e amigo sempre diz que Deus deveria ter parado a criação no quinto dia. Segundo ele, o mundo seria melhor.
O nosso desafio é torná-lo cada vez melhor, apesar de nós mesmos, humanos, "demasiadamente humanos".
Parabéns pela postura firme.
Gostei!!!
Bjo.
Bob

Anônimo disse...

Belo texto, vindo de uma boa escritora. Mas como sempre - sempre não é me restringindo aos seus textos, veja lá - textos relatando “tabus morais” tendem a serem muito mais teóricos do que efetivamente práticos; além de polêmicos (o que vale um comentário escrito no Word). Por que não um relato de uma boa ação, de uma defesa de “minorias”?
Se você cumprisse tudo o que diz; se eu cumprisse tudo o que li; se o mundo todo lesse e retese metade do que você escreveu; teríamos Louis Armstrong, à capela, cantando “Wonderful Word”. Mas para isso Deus, com todo certeza, pararia ou 5º dia, ou então, só descansaria no 8º.
Agora, o realmente me incomoda, é as pessoas gastarem tempo teorizando ao invés de praticando:
-> “não se deve fazer isso”; “não se deve dizer isto”; “não se fala assim” (use eufemismos e confie na “ingenuidade” alheia); e os piores de todos: cochichos e conversinhas por trás das costas. O que é uma completa falta de vergonha e respeito. Além, dos que deveria dar o exemplo de uma boa conduta, respeito, cuidado e compaixão, não estão muito afim de fazer algo. Os “menos vistos” também têm que dar exemplo. E os que se intitulam seguidores de Cristo (ou o bom cristão) mais ainda!!
Afinal: “O homem que diz "dou" / Não dá! / Porque quem dá mesmo / Não diz! / O homem que diz "vou" / Não vai! / Porque quando foi / Já não quis! / O homem que diz "sou" / Não é! / Porque quem é mesmo "é" / Não sou! / O homem que diz "tou" / Não tá / Porque ninguém tá / Quando quer” (Vinicius de Moraes).
Gastar-se tempo aprendendo a praticar, ok! Afinal, quando se trata de relacionar-se a tarefa não é fácil. Mas gastar tempo só teorizando... não dá, mesmo!!
E se parar para pensar como é fácil deixar de lado o orgulho, cultura medíocre, estereótipos e passar a pensar mais no próximo com amor, os preconceitos acabarão. ... mas estou começando a ser incoerente ao dar início à uma teoria. Logo, já vou indo.

Bjos

Obs.: o “anônimo” do comentário passado era eu. Não sei o porquê mas não apareceu meu nome. A propósito, gostei da sua resposta! :)

Seródio